domingo, 30 de setembro de 2007

20

"Atropelar um verso
é meter numa puta
um remorso
e um gozo"

in O alfabeta dos delírios, Luis Gustavo Cardoso, 2007.

Reflexão, ou adentro?

agora sou par
não sou mais só
habito na moça
de noite e de dia
que doce agonia
é ver-se invadida...ai

perdoa se, amigo,
dobrei a esquina, mas qual!
agora segue o ritual
o que fiz foi repetir
a figura no espelho
sou lá o devir?
o moço ou o velho?

serás vinte e um!
vinte e um!

onde andamos com desespero
há sujeira sem eira
larga a fada e a freira
e vamos ao Rio!
psiu...

somos a esfera
que ponto
quimera
espanto

melhor mulher
espasmo?
orgasmo
tanto!

Luis Gustavo Cardoso

Obs: Pela contagem imprevisível do círculo que temos traçado, é importante saber que quebrar o ritmo causa alterações naquele estranho relógio, dobra-se no 19 e tem-se 38, ficaram dois segundos ou duas imagens atrasadas até chegar a quarta casa?

terça-feira, 18 de setembro de 2007

19

No jardim:

Do amor quem corre
cai no beco de si
foge e quase morre
não é lá, nem aqui

fica em duas, despetala
com as dores suas
cinzas na sala...

Ao norte:

Não te mando, amigo, ao Ceará
de novo não, já estás!

Eis o forró e as margens
ribeirinhas da mocinha
deixa ela molhar a beira
da saia, da eia, ei-la
eira pendente sobre ti

leva um nosso samba
pois quem é bamba, é bamba
e embora ame, e embora doa
de amor mais bem amado
nunca deixa de lado
a nota aumentada
o ás de coração
e um seu violão

um verso perverso
por noites no norte
na rede há morte
há morte de amor!

Luis Gustavo Cardoso

sábado, 15 de setembro de 2007

18

Quantos vizires, duques
ocidentais, arqueduques
e arqueducados
arquedutos
caducos e desesperados
reinam fora aí?

Por aqui, sem nobreza e
mal amado
com o descompasso
compassado
vou surrando o coração

e a tua Dona Flor?
e o meu Sabonete?

que peça vazia
tem pouco desenho
vou lixar a porcaria
e surrá-la em qualquer vaga
por mais suja a fantasia
cabes no quadro
não vale o desdém
não vale o desdenho.

René Moraes

17

Pra ti:

Tenho de escrever
vou me corrigir
estive às flores demais
mar e sais, ai!
mas digo redimido
amigo, meu linho nobre
é minha pele, o violão
tu tens o dom
o dia, a duna, então
vai com a lança
e com uma flor
da coisa cuida o mundo
ai quem me dera ser vizir...
vai pro ceará que deus dará
que zeus dará o que há de vir.

Pra mim:

Vai com tudo
que eu tô mudo
quieto, sabe como é
só na cachaça
e noutro corpo...

Há tempo, é maresia
balanço tanto que já tô tonto
sou tanto mar, sou calmaria
sou turbulento, sou onda vadia
o verdadeiro desencontro

Vou te dizer: a coisa fria
esquenta dentro da gente como espanto
e é tão terna e funda e arredia...
nem cá nem lá, no canto

E digo mais, acima a consciência
que a moça põe tudo no papel,
amor, norma, pertinência...

mas sou eterno, sou aquele tropical
que se retrai, mas nunca deixa o sal
e que tem muita, muita paciência...

Luis Gustavo Cardoso

16

Olha lá, irmão meu
ando a escrever
com uma lança nas costas
posta em todo o dorso
vem da planta
sem espinhos mas muita graça
que por trás do cenário
espeta estes operários
que escrevem sem parar
As vezes, eu paro!
a fim de descanso
amigo meu...
e antes fujo ao Ceará.
entedio no estágio
trabalhos, o frio da aula
e o rigor da rotina ordinária
Fujo ao Ceará
com o arranjar
de outro estágio
outro frio mais quente
e alguém que intente
em o dia-a-dia
assassinar.

Obs: esta peça encaixa meio torto
deve ser a do canto.
Ela contorna...

René Moraes

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

15

Valha-me o tempo,
me deixa respirar, amigo
trago no trago o trago
na trama a trama da trama
a rama, a mulher, a fumaça
o cheiro do ópio da rama

Valha-me o vento, o olvido
me deixa não saber do tempo
tem tempo que estou envolvido
co'a moça de meca e de albana

ouvi no fantástico o trigo
colhendo a mulher e a flor
colhi, meu fantástico amigo
um prazer que é além da dor

olhei no espelho do umbigo
do centro do mundo ao redor
vi medo e força, e perigo
um amor sufocando uma dor

já tenho nos olhos o vento
e o mar vai no peito aguerrido
vou homem,"pra tanto há tanto fogo
no coração do bandido".

Luis Gustavo Cardoso

terça-feira, 11 de setembro de 2007

14

7 + 7 = 14
Tal qual tu, amigo meu
resolvi desmembrar o número
na certa de que o maravilhoso viria...
Sabes bem o que o sete ilustra, não?
Ah, fizeste, logo abaixo, para o azarão
uma cantiga arrancadora de cores.
Adentro o gosto pela numerologia
seja feito do fácil ao fim:
ora, amigo meu
quantos dias passaste na semana?
com quantas cores foram feitos
arco-íris e pecados?
dou-te sete notas
e Jobim nenhum fára sambas com uma apenas,
haja pena, haja vôo e sete pirâmides,
sete artes.
Fiz de mim místico
mas não vale de nada o texto acima
se eu não espelhá-lo;
verdade dita,
este és o dobro!

este és o dobro!
verdade dita,
se eu não espelhá-lo;
não vale de nada o texto acima
Fiz de mim místico
sete artes.
haja pena, haja vôo, sete pirâmides,
e Jobim nenhum fára sambas com uma apenas,
dou-te sete notas
arco-íris e pecados
com quantas cores foram feitos?
quantos dias passaste na semana...
ora, amigo meu
seja feito do fácil ao fim:
Adentre o gosto pela numerologia
sê uma cantiga arrancadora de cores.
Ah, fizeste abaixo para o azarão?
Sabes bem o que o treze ilustra, não?
na certa de que o maravilhoso viria...
resolvi desmembrar o número
Tal qual tu, amigo meu
7 + 7 = 14

Espelhado!

René Moraes

sábado, 8 de setembro de 2007

13

Cantiga abridora, pra tirar a cor do número treze:

"Dobra-te, treze, tens maciezas
deixa a sina dar seu cabo próprio
deixa a sorte à própria sorte
sê mais vida do que morte!

hão de os algarismos mais
achar caminhos inusuiais
outras posuras de poesia
lá estarão a fé-doidura
e mundo outro que se costura
que a linha da vida fia"

Peça:

Vou no galope, o coração arado
tenho na terra a flor e a esperança
vou tão feliz amigo, o peito aberto
sempre desperto o poeta não cansa

deixemos o soneto, vou no galope
a dama à frente
deixei à sua janela azuis
esqueci meu coração por ali
quem pode ouví-lo bater?

vai-te ao norte
com relembranças manhanãs
muriçocas suportáveis
envios de amor desérticos,
hei de retomar a forma...
informa o Ceará que eu tô bem:
minha viola, o braço, sem vintém
um sonho dorme em minha cama
no travesseiro odores me visitam
jardins do semi-árido
de mar-além...

Luis Gustavo Cardoso

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

12

Um dia, ó poeta,
disseram-me a não escrever
aliás, digo-te que fizeram ontem
igual
novamente, vê se pode
irritei-me demais
fujo ao Ceará toda vez que eu posso
faze como eu
enraiza logo no teu amor.
De tão unido está
meu amor ao escrito
que cada tecla batida
passa, a mente minha, pela
moça sem defeito
faço das teclas seu rosto perfeito
e trato de acariciar
ah amigo meu!
ensinaste-me a pegar pelos desvios
afobo-me não mais
com essa dúzia eu confesso
sentir não mais perdido
aos que abafam meus escritos
tentam, é vero, enforcar
esse novo amor renascido.

A força de homem,
delicadeza desse mesmo,
está no digitar do teclado...

René Moraes

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

11

Escreve e ama, vê lá o verbo...
É que tem flor, amigo
de tão sutil não deixa nada
só um perfume tenro
um berro dentro, a pá virada
no peito, na boca um esquecido
gosto que foi, do não vivido.
É que tem flor, amigo
a tua, a minha
que vira o terno e põe na cama
o rídiculo poeta em quem ama...
Pra essa mulher, amigo, cuidado
se vai pro norte, fica ligado
sê noturno e brando, pois que
a flor requer cuidado de
homem, força de homem,
delicadeza de homem...

com um não-querer, com resistência
recua, e quer o abraço...

Luis Gustavo Cardoso

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

10

"Tum, tum, tum!"
Quebram-se as cabeças, amigo meu
mas tenhas o coração intacto
quando me acordaste foi com açoite
despertaste a fúria do escrito
e agora?
agora tenho um amor bendito
e a máquina de teclar.
Ufa!
no fim agradeço todo o feito
arrumei a moça sem nenhum defeito
que cheira a maçã-verde
ah... nada como me acalmar
aprendi a escrever
justo quando senti o amar.

René Moraes

terça-feira, 4 de setembro de 2007

9

As algas sim
tenho meus copos de água doce
bem sabes
agora é noite
sou meu violão
sou tão sertão!
Tenho no coração uma viola
uma morena enluarada
se disserem que é tarde
qual nada, quem arde
e foge, tem medo
da gula do trovão
receio do sal, do doce
do amar impedido,
do malandro rendido
que não se rende
da areia do chão
daquilo que bate
bate que bate
que faz tum, tum
no coração...

Luis Gustavo Cardoso

8

Qual é amigo meu
que curso é este de botânica
não aprendes nada de sensato
flor nenhuma cresce em mar
gostam é de mato
trata-te de adoçar!
Queres saber? Tu nem ouves meus conselhos
foi logo falando de Bahia, Dorival
eu te aviso... foge de lá, faz-te mal!
por aqui ando sendo bem cuidado
Avaré, sou matutinho, papai, mamãe
semana que vem
volto a Franca
e vamos ter muito de conversar
mas por enquanto
vê se te manca
escuta-me antes de repousar
dá um jeito nestas águas
trata-te de adoçar!

René Moraes

7

Tenho não, nem quero ser
vai no coração a flor
no peito a arder
está nalgum cantinho
salgado em mim,
engraçado, que apesar de tudo
do amor, da flor, do conteúdo
ainda sou o bom
e corriqueiro poeta
malandro até talvez,vai da dieta...
Eu leio os lá de fora,
e da Bahia, Dorival
Alah tome conta
um vendaval de poesia
navega em mim.
Mas vê, tu tens o norte
e a doutora, te cuida
das letras, da cena
que vale a vida
que vale a pena.

Luis Gustavo Cardoso

6

Amigo, como aguardo minha partida
cansei, tro!
verdade, imagino-me indo logo a pé
o avião pesa demais, taí emoções que eu desprezo
chega de lavar-me a sabão
e tu? irmão meu
já tens a flor na mão?
Ah! esse Ceará deixa-me ansioso
eu, branco-gelo naquela areia-sol
derretendo-me inteiro, mas terei creme hidratante
e tu? irmão meu
já tens a flor na estante?
difícil demais? aliás,
dou te um conselho vá ler Dumas
leia o filho, o pai não
esquece um pouco a literatura nacional
vem comigo visitar o calor
mas fujas da Bahia
ouvi boatos de uma tal de Dona Flor
uma leitura dessas deixar-te-á angustiado
vá por mim, sê amado
mas não sejas Jorge.

René Moraes

5

Diga a ela que a estrada do sol
do tempo, vai no fio do chão
vai com dedos no violão
sentimento, menta, acordeon
vê se me traz um trecho de norte
vê se não volta mais não
pois que ficando lá, tu ficas bem
mas manda carta, barro, Zeus também
finca na areia o Ceará e o coração
deixa que a alma e o sabonete
vivam à soberana aflição
de amar, contudo, com tudo, amigo
com toda a mão
com toda a fé, toda afeição
sê lá o homem, aqui o amigo
pra toda sorte de perigo
meu amigo e meu irmão.

Luis Gustavo Cardoso

4

Assim será, amigo meu!
quantas essências provadas, quantas podas mal dadas
e quem enraiza és tu!
somos nós, peço desculpas, verdade é...
eu me grudo no afro-axé
e tu nos alicates de defloreio
levo sim o violãozinho pois tu mesmo me acordaste
e "eu acordei" vontade imensa de tocar os trastes
o embornal irá também
levo ração, canção, vintém
no medo de não me alimentar
cairá mal o siri talvez?
de resto, enquanto paparicos à nívea minha
vendo teu mar de perto...
sei que estarás lá
pelas águas encoberto
já o soluço
engole a seco
caso custe a descer
jogue um bom bocado de sal
talvez tempere o amaro.
Bom saber-te feliz.
ah, fica com o terno
uso mais não,
de fato, nem de linho é
e veste-me tal qual caixão.

René Moraes

3

Diga a ela, meu amigo, que têm essências
ambas, camélia e nívea, adormecências
e cada uma com seu cada qual
a tua amanhece nordeste sobre ti
e a minha anoiteice em meu peito
foi pra capital, deixou-me ao vento
uivando maresias, um desajeito.
Há de voltar, tenho certeza
tu tens de ir com pés de vento
pés de moleque do interior
leva contigo um embornal, um terno
de linho, leva tua manha e o violãozinho
um par de letras pra pôr no papel...
Diga a nívea que tenho soluçado
com uma flor, essa daqui tirou de mim
a malandragem, meu sentimento emancipou
sou rastro na areia, sou mar na veia,
leva contigo a amizade e a fé
tô por aqui, à paz, à pé
com saudades da amélia...

Luis Gustavo Cardoso

2

Digo-te enciumado que sabonete não se divide!
Vá mexer em citronelas, arlequins, camélias tanto me faz!
mas queimo de um sol cearense se estranhos usam do meu creme
hello, hello Brasil, em outubro vou pro Ceará
com bençãos ou não de Orixás
digo-te que o meu fulvo-bauxita daqui a ofusca até lá e
quando me ensurdo ela me cura
caso ela esqueça da escrita deixa que eu rasgo com tinta a folha e
faço o que fizeste lindamente
ajuda-me com o quebra-cabeça, mas vê lá o que deveras sentes...
sei bem o que dizer e diga-te à tua que mandei um abraço!
só por ciúmes...
pois de praxe não mandaria.

se o vento me leva até lá
que o mar me trague e eu não volte

René Moraes

1

Diga a ela que tem nome de sabonete,
tu tens de perfume francês contrabandeado.
Chegaram os tempos novos, aurora te carregue
ao norte com o vento sul, daqui pra lá mais
caminhão. Penso em Zeus night and day,
diga a ela que sabonete original banhado
no Ceará tem mais fibra que colônia, e
que ainda assim vocês devem ficar juntos.
Diga a ela que o cordel adormece em ti
antes de nasceres, que acordas recitando
vidro com sotaques estranhos, acentuadamente
de cacau e álcool. Diga a ela que tens o
cabelo avermelhado por conta dessa aurora,
que respiras nos intervalos da sintaxe
dela, que ela fonoaudiologiza tua escrita
sonora, que teu violão quer pegar fogo.
Diga a ela que tens no Ceará a cabeça,
que o quebra-cabeça começou.

Luis Gustavo Cardoso